Mais de dois bilhões de toneladas de lixo são produzidas anualmente, aponta um relatório da Organização das Nações Unidas. Eles também afirmam que 99% dos produtos que compramos são jogados fora em apenas seis meses, em média. Seriam necessários 70% de outro planeta Terra para sustentar o consumo no atual ritmo.
A ideia do mundo que queremos deixar para as próximas gerações já foi substituída pela urgência de repensar o impacto das nossas ações no presente, assim como o ciclo de produção, utilização e descarte de recursos e resíduos. Reavaliar o envolvimento das comunidades locais para impulsionar diferentes iniciativas também está – ou deveria estar- na ordem do dia.
Uma boa notícia neste cenário apocalíptico é o aumento do interesse de arquitetos, designers e artistas pela inovação. Verdadeiros laboratórios de pesquisa desenvolvem produtos a partir das matérias-primas mais inesperadas – quem imaginaria um tecido feito com água de coco? Eles buscam soluções em sintonia com o cuidado dos animais, o equilíbrio do clima, o combate ao desperdício e alternativas ao uso do plástico.
Ouro reciclado – isso mesmo
A dupla de designers Andrea Trimarchi e Simone Farresin, da Formafantasma, criou o projeto Ore Streams para explorar o potencial de reaproveitamento de lixo eletrônico. Eles reaproveitam o ouro, presente em circuitos de computadores e outros equipamentos, em novos acabamentos em superfícies. Eles também ressignificaram caixas de celulares, teclados de laptops, peças de micro-ondas e outros itens. Assim, chamam a atenção para o crescente descarte de eletrônicos e a velocidade em que se tornam obsoletos.
Água de coco
Seetal Solanki é fundador do studio de design chamado Ma-tt-er, que desenvolveu o composto Malai. Vegano e resistente à água, ele parece com couro ou papel. Na verdade, é produzido por bactérias naturalmente presentes na água de coco, que se desenvolvem em um ambiente úmido. A cultura da bactéria é alimentada pela água de coco – considerada um resíduo -, recolhida pelos agricultores do sul da Índia, que trabalham com o processamento do fruto.
Leveduras e bactérias
No projeto From Peel to Peel (da casca à casca, em tradução livre), a designer italiana Emma Sicher produz embalagens descartáveis de alimentos. Sua matéria-prima? Uma cultura de microorganismos que proliferam nas sobras de frutas e vegetais. Eles reagem e transformam a frutose e as vitaminas em camadas de celulose.
Pode parecer bastante esquisito, mas o resultado, semelhante à gelatina, descansa, passa por um processo de secagem e se torna uma folha translúcida. O material pode ter várias aplicações, moldando objetos, acessórios e outros itens.
Planterna
Partículas que promovem a bioluminescência, como o brilho das águas-vivas, podem gerar luz e reduzir o consumo de energia elétrica. Essa é a ideia de dois cientistas americanos, Michael Strano e Sheila Kennedy, que incorporaram nanopartículas de luciferase em folhas de agrião (foto) e outras plantas. Surgiu assim a Planterna ou os Planters.
A tecnologia permitiria, por exemplo, transformar árvores em postes de luz ou utilizá-las para iluminar uma casa.
Traje funerário sustentável
Um dos pontos críticos para o meio ambiente é o tempo de decomposição de materiais e a pegada de carbono que cada produto deixa no planeta. A ideia é levada ao extremo nesta invenção – um traje funerário feito de micro-organismos e fios de cogumelos.
O artista Jae Rhim Lee desenvolveu esta roupa que neutraliza as toxinas liberadas no processo e ainda transfere os nutrientes para as plantas ao redor. O Infinity Burial Suit custa US.500, também vai disponibilizar os trajes para pets (!) e tem fila de espera de clientes.
Estruturas submersas
O artista israelense Erez Nevi Pana mergulhou estruturas em madeira envolvidas com buchas no Mar Morto, que possui altas concentrações de sal. Ele as deixou cristalizar, como a formação de corais. O resultado são peças como a Bleached (branqueada), que evoca uma imediata consciência sobre a importância de preservar a vida marinha e o impacto da interação humana com o meio ambiente.
Couro de palmeira
Com fibras de folhas da palmeira tratadas, é possível criar um material semelhante ao couro e com elas fazer tapetes. O estilista holandês Tjeerd Veenhoven encontrou, assim, uma alternativa sustentável e vegana ao couro tradicional, após oito anos de pesquisa.
Couro de abacaxi
A marca Votch já venceu um Vegan Awards. Ela fabrica relógios ecológicos, e uma das linhas apresenta um material chamado Pinatex, nome derivado de pineapple (abacaxi, em inglês). As folhas da planta são utilizadas para compor essa espécie de couro utilizada nas pulseiras.
Alternativa ao couro tradicional
Outra experiência que resultou em um material semelhante ao couro foi realizada pelo designer Don Kwaning. Ele começou a pesquisar a composição do linóleo, e seu resultado chegou ao Lino: composto resistente e vegano que pode ser empregado em móveis e estofados. A variação de cores depende da farinha de madeira incluída como um dos componentes.
Tecido vegano de maçã
Mesmo as grandes marcas e designers estão se envolvendo na experimentação de novos materiais. A Cassina se uniu ao designer francês Philippe Starck, que reinventou algumas peças empregando um tecido vegano feito de maçãs que seriam descartadas como lixo industrial. Chamado de Apple Ten Lork, o material rendeu inclusive uma premiado no PETA Vegan Homeware Awards 2019. O PETA é uma fundação que reúne ativistas ligados ao tratamento ético com animais.
Santuário de borboletas monarca
A população das borboletas monarca enfrenta um grave declínio, o que alerta para o desequilíbrio ambiental e o uso excessivo de pesticidas. O projeto Terreform One instalou este ano em Nova Iorque um pequeno edifício comercial que é um verdadeiro bioma, integrando o habitat das borboletas em suas fachadas e no telhado.
A ação traz as borboletas para a cidade, amplia a presença de outras espécies e demonstra o que deveria parecer óbvio: plantas, insetos e seres humanos podem coexistir em harmonia.
É pouco provável que estas ideias resolvam os problemas enfrentados hoje no planeta, tampouco sejam fabricadas em larga escala. Mas o conjunto dessas criações tem o papel de fortalecer uma mensagem e um legado, compreendidos e compartilhados por um número maior de pessoas.